Jornalismo Cidadão é terceiro conhecimento

Li dois posts sobre a questão do jornalismo-cidadão (a moda de atribuir a qualquer um a função de ser jornalista, haja visto blogs, fotologs, podcast, Ohmynews etcetera).

Os posts I e II, publicado no Intermezzo, relatam o debate sobre o tema, realizado na USP, com Ana Brambilla (vai estar aqui em Vix em maio) e Hamilton dos Santos, ambos da Editora Abril.

Gosto muito da discussão, e concordo com essa rapaziada que o jornalista é agora mais um guia do que um oráculo, já que com a evolução constante de sistemas de publicação amadora da Internet, o público entrou na farra e agora narra as suas histórias e a dos outros também.

O Henrique Antoun, gente boa demais e fodão quando o assunto é internet, diz uma coisa bacana. Para ele, certos produtos do jornalismo-cidadão (como blogs, por exemplo) se remetem aquilo que o filósofo Spinosa chama de terceiro gênero de conhecimento, como algo relacionado a um conhecimento intuitivo e sensitivo.

Num ótimo post, no seu Mediação-Mobilidade, Antoun explica isso tudo tim-tim-por-tim-tim. Para ele, não dá para pôr blogs e jornal no mesmo saco, pois o conhecimento é distinto:

As pessoas lêem e frequentam blogs procurando uma info afetiva e não uma info genérica, pura e simplesmente. Vc lê os afetos e não o conteúdo das idéias ou opiniões em um blog. Pra ler o conteúdo elas tem os jornais. O blog é lido pq eu amo ou odeio o q o blogueiro escreve, o jeitão dele escrever, o mundo próprio dele. No blog o conhecimento de terceiro gênero é + importante.

[…]

Sem querer aborrecer d+ todo mundo com filosofia; o conhecimento de primeiro gênero é o conhecimento “pelo signo”; do tipo ouvi falar, vi na novela, assisti no filme, li no livro…. Conhecimento onde a experiência não conta e o que conta é “o q todo mundo acha”, “diz”, “julga”. O conhecimento pelo signo é a principal fonte do preconceito e da superstição. É tb a principal fonte política da dominação. Hj em dia o conhecimento do primeiro gênero é o conhecimento pela mídia: jornal, tv, etc. Neste tipo de conhecimento o q conta é a autoridade: sacerdotes ou instituições. É o império dos formadores de opinião.

[…]

O conhecimento do terceiro gênero é o conhecimento que faz conceitos claros e distintos das afecções e afetos que provou. O conhecimento pelo entendimento do afeto e da afecção trazido pela idéia ao espírito. É o entendimento da alegria de seu mundo próprio e das paixões alegres; ou seja das paixões ativas e produtivas em vc.

O lance então é que o jornalismo profissional se remete a um conhecimento mais moral. O jornalismo então teria essa teleologia. É curioso que todas as formas de produção jornalística efetuada por cidadãos não-jornalistas sempre têm a mediação do jornalista. Continuam sendo um conhecimento moral.

Por isso que acho que a novidade que traz a Internet não está tanto no jornalismo-cidadão como conhecimento moral, mas no jornalismo-cidadão como conhecimento sensitivo e singular, como pensa o Antoun.

Mas isso é, para mim, ainda uma hipótese muito influenciada pelo pensamento do Antoun. Algo que preciso estudar mais. Segue uma boa discussão ativada por Ana Brambilla, via Intermezzo (que através de Beth Saad publicou a seguinte informação sobre o debate paulistano):

Ana Brambilla chama atenção para uma confusão de papéis que a onda do jornalismo participativo traz, passando por cima de conceitos fundadores. Não existem, porque não cabem, os ditos “cidadãos jornalistas”. Na verdade o que ambientes participativos estimulam é a emergência de “cidadãos-repórteres”, que executam aquela parte do processo jornalístico de reportar, relatar a realidade, trazer diferentes visões de um mesmo fato. Aqui, o cidadão pode contribuir muito, até mais que o próprio jornalista ou uma redação inteira que não tem condições de estar em todos os mundos ou dominar todas as fontes. Ali, no veículo e no blog, o jornalista e o editor, podem exercer seus papéis de forma enriquecida.

1 Comentário

  1. Fabio, legal a vinculacao de nosso Intermezzo a seus comentãrios. Apenas uma correçâoÇ o post em citaçcao nao eh da Ana Brambilla, que figura como fonte no mesmo. O post e demaois relatos sao de minha autoria. Abs, Beth Saad

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