A evolução do #ZikaVirus no Twitter

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Em março de 2015, notei que as menções acerca da dengue cresciam no Twitter. Entre 14 e 21 daquele mês, as menções de fato subiram: 37.200 tweets, apenas em língua portuguesa. Quase um ano depois, durante o período de 04 a 11 de fevereiro de 2016, ao coletar o tema, o registro batia 311.777 tweets.

Se em 2015 a dengue era destaque em função do crescimento de casos no Estado de São Paulo; em 2016, o termo se nacionalizou colocando no vocabulário político o termo ‘Zika Vírus’. Antes tratado como “infecção benigna”, o Zika Vírus se alastrou pela América e pelas redes sociais, batendo só na última semana 1.376.773 tweets distintos (em todos os idiomas): 39% das menções são em língua espanhola (794.744 tweet), seguidos de 33,25% tweets em inglês e 13,9% em português (311.777). Isso reforça a tese de que a rede é capaz de ajudar a traçar o território da doença.

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Por curiosidade também tracei uma amostra de tweets contendo sus respectivas coordenadas geográficas e as plotei num mapa. Interessante como o ‪#‎ZikaVírus‬ é um assunto do continente americano, com maior incidência no Brasil, Argentina, Colômbia e EUA. Os dados geográficos dos tweets demonstram como a epidemiologia precisa dialogar com os dados de redes sociais. Já insisti nisso nesse pequeno artigo: https://www.facebook.com/fabio.malini/posts/10153906284296151

No vocabulário em torno da epidemia, visto nas nuvens de palavras, em março de 2015, os termos são orientados aos locais da doença (São Paulo, Uberaba, cemitérios, cidade) e ao seu registro (terrenos, atendimento, alerta, casos, focos). O eixo territorial era a cidade de São Paulo.

Em 2016, o eixo territorial dos registros online se desloca para o Brasil, Colômbia e EUA. E correlaciona o Aedes com as Olimpíadas, por ser a ‪#‎Zika‬ uma ameaça aos turistas e atletas olimpícos. Instituições de saúde pública, como a Fiocruz e a OMS, são continuamente mencionadas, em função de seus relatórios sobre algumas descobertas sobre as formas de contágio do zica e sua relação com a microcefalia.

Os dados são muito ricos para análises tanto qualitativa, quanto quantitativas. E ajudam a entender como essa epidemia ganhou contornos de pânico global.

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O Primeiro Ato #ContraTarifa2016 no Twitter: o aumento e o deboche

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Grafo 01 – Rede global de RTs sobre o aumento da passagem de ônibus e trem em cidades brasileiras

Entre 31 de dezembro e 09 de janeiro coletei postagens no Twitter sobre o aumento da passagem de ônibus e trem em diferentes cidades brasileiras. Foram 135 mil tweets, um recorde em minhas coletas sobre o tema para tão curto espaço de tempo. Nesse período, ocorre um dos efeitos colaterais do aumento: a convocação de protestos #ContraTarifa (principalmente em SP, RJ e BH). Um primeiro dado interessante se relaciona com o que veio antes das manifestações. Primeiro porque os movimentos acertaram em sincronizar nacionalmente o dia 08 como o dia de luta contra a tarifa. A sincronização – em tempo de internet 2.0 – é sempre um golaço pois agita e mobiliza redes diferentes em torno do mesmo tema,no mesmo dia e na mesma hora. Segundo porque a presença de perfis que nada tem a ver com o MPL e com os governos. É uma espécie de “nova geração” do Twitter. Ela articula entretenimento, política e memetização. Esses usuários estão agrupados nas sub-redes que formam o grafo 02. Não se sensibilizam nem pelo discurso que critica a repressão da PM a ativistas, nem pelo dos “mascarados infiltrados” do conservadorismo. E sim pelas dimensões concretas que significam dispender R$ 3,80 (quando em SP/RJ) da sua renda para pagar um transporte público de péssima qualidade.

Diria que o MPL e todos os movimentos-rede precisam acrescer às suas narrativas (um front também de lutas) a linguagem de GIFs e Memes políticos para dialogar com essa nova geração de usuários do Twitter/Facebook, para assim convocar novas adesões nas ruas e impulsionar compartilhamentos pelos ativistas de sofá (fundamentais em difundir o que ocorre nas ruas). É uma tarefa urgente dos movimentos retuitarem, darem replies, enfim mencionar para articular uma narrativa mais forme que escape ao “ao vivo” e mantenha uma atividade mais contínua de formação de opinião e mobilização política nesse canto da internet 2.0.

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Grafo 02 – Redes da nova geração de usuários de Twitter repercute o aumento da tarifa

Acompanho as redes do movimento #passelivre desde junho de 2013. Como naquele ano a narrativa do #PasseLivre2016 escapa àquela visões ora criminalizadoras do movimento (a partir da linha do vandalismo e do “acabou em tumulto”), ora deslegitimadoras do movimento (por neles existirem “infiltrados” violentos), teses respectivamente da direita e esquerda governistas. Nos últimos 15 dias, 40% dos conteúdos representam compartilhamentos da rede de comentaristas de Twitter que se posicionam contra o aumento da tarifa (principalmente em SP e RJ), mas que possui mundo, linguagem e atores próprio (grafo 02). Eles criam, usando o humor, a percepção de que aumento é algo abusivo e que aprofunda a crise econômica dos mais pobres. O tom humorado em ser contra é auxiliado pela “justificativa” de que o aumento se deve aos serviços de luxo que hipoteticamente que estariam embarcados no preço da passagem: “3,80 com open bar”, “vem com janta”, “tem wi fi e sofá cama”, “vai ter show do wesley safadão no ônibus”, “tem mordomo carregando casaco?”, “1a classe com champanhe”, “com banheira de espuma”, “com login do netflix de brinde”. Ou articulando o valor da tarifa com situações cotidianas da rede (“se tivéssemos votado em inês brasil a tarifa seria um real e meio”, “achei que estavam falando do preço do dólar”, “busão já pode ser considerado uber?”). Um pouco dos tweets dessa turma: bit.ly/1RwlykL, bit.ly/1Om3qDV, bit.ly/1OdqM0E, bit.ly/1mPCmX3 e bit.ly/1SJa1h1.

Não se sabe até que ponto essa ironia é apenas um modo de crítica política passiva acerca do aumento. Ou seja, a transformação de um tema político relevante em assunto do momento para ganhar likes e Rts. Mas, de qualquer modo, a viralização forte dessas mensagens demonstram a negativa popular que as medidas dos governos enfrentam. A questão é saber o quão os movimentos de rua agora vão conseguir capturar a indignação popular quanto à qualidade dos serviços públicos de transporte e conseguir emplacar um revés no aumento, em meio, é claro, à repressão policial, cuja força será diretamente proporcional à popularidade que as ruas vão alcançar, como sabemos.

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grafo 03 – Governistas e redes do MPL disputam a centralidade da narrativa sobre o #ContraTarifa

Nesse sentido, se a narrativa dessa nova geração de tuiteiros se situa em memes e gifs satíricos acerca do preço da passagem num regime de conversações colaborativas, os usuários que compõem as perspectivas representadas nas subredes redes azul escuro, azul claro e vermelho (grafo 03) estão em outro campo comunicacional, no das conversações conflituosas, numa territorialidade de disputa política.

A rede petista (vermelha) expressa uma perspectiva que só emerge quando ocorre o protesto de rua contra o aumento, lido como “contra Haddad”. É uma rede que sofre de complexo bipolar. Há momentos que quer ser contra o aumento (http://bit.ly/22VurId) em outros, apenas criticar o MPL, visto como um movimento antipetista e violento, por causa da “possível” ação de Black blocs nos atos. Nessa visão de mundo, mais paulista do que nacional, o MPL colabora com a direita, ao não “mirar” o Palácio dos Bandeirantes, que possui responsabilidade no aumento da tarifa de trem, de metrô e dos pedágios. Concretamente, a bipolaridade é só um modo estratégico de se tentar manter à esquerda ao mesmo tempo em que ampara a defesa do PT e de seus aliados locais (SP e RJ). Como MPL estivessem não está sob o controle do secretariado governista, atacam a própria diversidade dos atos de rua, compostos por diferentes movimentos e por partidos, o que inclui até petistas.

Interessante na rede ver a ausência da @cartacapital, que fingiu não ser com ela e não cobriu os atos pelo Twitter. E vale o destaque ao “desgarramento” de três coletivos:
Jornalistas Livres, Diário do Centro do Mundo e até o Brasil 247, bastante retuitados pelas redes vermelha e azul clara, deixando claro a predileção editorial por estarem na produção de conteúdo original das manifestações ou as repercutindo. Alguns tweets que ilustram boa parte do meu argumento: http://bit.ly/1ScUBlP, http://bit.ly/1UIGcLS, bit.ly/1ZfNuIC, bit.ly/1VYRkWt, bit.ly/1ZmN7kR, bit.ly/22V1DPZ, bit.ly/1SJ9Ja2 e bit.ly/1OWV4rU

A rede da perspectiva azul escuro concentra os apoiadores das ações da Polícia Militar durante os protestos do dia 08. É uma rede de apoio à repressão política mais do que uma rede de pensamento político conservador. Depredações, baderneiros, marginalzinhos, vândalos, mascarados, vandalismo e até terroristas do MPL estão no rol do léxico dos tweets feitos pelos perfis que não discutem o porquê do aumento da passagem, e sim se concentram em serem contra as movimentações que terminam em “tumulto”. Sempre se emudecem quando as imagens do dia seguinte demonstram flagrantes forçados, cidadãos violentados injustamente (o que inclui ai jornalistas) e registros de P2 executando depredações.

A estrutura narrativa já é bastante conhecida. E são emoldurados não mais pela imprensa, mas pelo conteúdo policial que é repercutido também por segmentos principalmente televisivo da imprensa. De quase 10 tweets da Polícia Militar de SP, oito mostravam imagens de “depredação” ou de “policiais com ferimentos”. A estratégia deliberada da polícia paulista foi de tipificar a manifestação como violenta, no intuito de afastar a luz sobre o debate público em torno do aumento da tarifa. A estratégia foi complementada pela turma de perfis conversadores, que multiplicavam compartilhamentos baseado na ideia de que O MPL é braço do PT, apoiador do “Fica Dilma”, é gente que sente “ira contra centavos e indiferença contra bilhões roubados da Petrobrás”. A desconexão do MPL com as questões ligadas à crise econômica (em boa parte gerada pela política econômica do governo Dilma) tem facilitado que o movimento seja taxado como localistas, não integrado a causas mais amplas, com a luta contra a inflação, arrocho, aumento da tarifa de serviços públicos, como de energia. A rede da direita aproveita esse vácuo para esvaziar o legítimo motivo da manifestação, tendo o MPL também como alvo.

Assim, longe de se diferenciarem, os coletivos de de espectro governista (petista&tucana) agem de maneira integrada, com foco em rotular as manifestações (ma rua e na rede) como atos provindos de uma minoria violenta e radical. Esse rótulo ajudaria atingir, com apoio dos veículos de comunicação de massa, as populações pobres desconectadas, em geral arredia quanto ao uso de qualquer tipo violência em protestos, se opondo assim aos tumultos das ruas. Contudo, essa estratégia governista tem como limite a popularidade dos governos (que não andam nada boa em SP, RJ e BH) e a adesão popular às ações desencadeadas pelo MPL. Sintoma de que a bola está dividida pode ser visto nos comentários a esse tweet (<<< link >>>) do governador Alckmin, que não demorou a tipifica, na sexta mesmo, os movimentos como atos de vândalos. Alckmin possui o discurso da repressão já calibrado. Haddad, em silêncio no Twitter, deixa o governador fazer o trabalho por ele.

Uma observação interessante: fazem parte do grupo azul os retweets dos perfis do MBL (bit.ly/1mPUJKS) e do Revoltados Online (bit.ly/1mPUC21). Ambos não criticam, em nada, o aumento da tarifa. Um pouco de teweets bastante replicado e comentado da rede de apoio à repressão pode ser lido aqui: bit.ly/1OdrKdi, bit.ly/1mPFBh8, bit.ly/1VYVXQj, bit.ly/1ZfQhBq, bit.ly/1IYqqfz, bit.ly/1P2qZkp, bit.ly/1K8wLje, bit.ly/1PnjPry, bit.ly/1kZL6rT e bit.ly/1Pnk467

Os perfis que se agrupam no cluster azul claro formam a perspectiva dos movimentos de ruas que ocorrem pelo país. São três tipos de perfis: os convocadores, os narradores e os comentaristas dos atos. Os convocadores são os próprios protagonistas da mobilização, que giram em torno do Movimento Passe Livre (@mpl_sp, mpljoinvile, @tarifazerobh), além de perfis ligados ao coletivo Anonymous (Rio e anonopsbrazil), que andavam sumidos da difusão das lutas urbanas no Brasil. Esses perfis convocadores tambem cuidaram de narrar os acontecimentos de rua, não deixando muita brecha para um oligopólio narrativos dos veículos de imprensa. Contudo, faz parte dessa perspectiva os perfis do Globo Política, El Pais, Estados de Minas, Jornalistas Livres, Mídia Ninja e Huffington Post, Uol e Exame, por estes terem sido bastante retuitados pelos ativistas. Essa novidade ocorre em função da propagação de flagrantes forjados por policiais ou pelo fato desses veículos estarem noticiando, de dentro das manifestações, ao vivo, o andamento dos atos. Esses veículos acabam equilibrando a disputa na grande narrativa midiática, já que os perfis no Twitter das emissoras de tevê (não apenas) reforçavam muito mais os atos de vandalismo.

Queria destacar uma nuance preocupante, do ponto de vista das ruas: a fragilidade de organização que se encontra a rede do MPL no Twitter. Enquanto há um alto volume de perfis (grafo 02) criticando o preço da passagem (mas desconectados com a rede das ruas), os perfis que são atraídos pela rede do MPL se caracterizam mais pelo interesse dramático dos atos (que sempre esquenta a audiência) do que pela pressão sobre a decisão tarifária dos governos. Isso ocorre, em certa medida, pelo fato de o MPL conter poucos formadores de opinião sobre a causa da mobilidade urbana no microblog. Esses formadores, ou comentaristas críticos, são os mediadores da rede. Ou seja, possuem o poder de transmutar os sentidos dos fatos. Eles interpretam não apenas os sentidos dos protestos, mas alargam aqueles ligados ao debate intelectual e político em torno do valor da tarifa, da relação Estado x movimentos, dos conflitos entre policiais e ativistas, além de fazerem os links entre a questão social e a questão urbana, enfim, esse esvaziamento intelectual no entorno do MPL no Twitter pode acontecer menos no Facebook (um locus mais apropriado à discussão, é verdade), contudo, isso faz com que o espalhamento (sempre dependente, nesse caso, da turma esquerdista do sofá) fique muito prejudicada, dificultando a tática comunicacional de transformar um ato em trending topic. O que sobra nas redes governistas (comentaristas) tem faltado na dos movimentos de rua. Alguns dos tweets (com comentários) da rede das ruas pode ser conferido em: bit.ly/1RwnBp1, bit.ly/1PZoUuN, bit.ly/1RhKtYN, bit.ly/1N2DknB, bit.ly/1mPCPbN, bit.ly/1mPRUJK, bit.ly/1RFyQcW, bit.ly/1mPDppR, bit.ly/1kZJ6Qm, bit.ly/1PRQpV8, bit.ly/1N2CGGI e bit.ly/1VYUp8R.

Para finalizar, alguns números:
137.164 tweets com termos ligados ao aumento da passagem de ônibus e trem no Brasil.
39.643 usuários distintos tuitaram sobre o tema.
67693 retweets de 32322 “remetentes” para 5497 destinatários.