No debate, Giuseppe Cocco critica “Estado Racista”

Em um debate importante, o autor de Global destca que o problema do Brasil não é só o neoliberalismo, mas o Estado:

É preciso colocar a produção do saber no interior das produções das lutas. Isto para acabar com a dimensão elitista brasileira. Acabar com a desigualdade universitária no Brasil. Nomadizar é criar novos espaços de saber e espaços de lutas. No Brasil 2,7% das pessoas estão dentro das universidades federais. Saber no Brasil significa que um outro não saiba. Em um contexto de produção imaterial, de economia do conhecimento, isto nos paralisa. E isto (a não universalização) fez com que a educação superior se tornasse um grande business a partir da década de 90. O problema do sucateamento da universidade no Brasil não é o neoliberalismo. A universidade foi sucateada pelo corporativismo. Para cada professor há cinco alunos na Universidade. Na minha universidade [Cocco é professor da UFRJ] as greves são decididas por 20 professores. E todos os outros 3 mil ficam em casa recebendo sem trabalhar. Muitos não contestam. O neoliberalismo é muito pouco historicamente. São só dez anos. O que sucatea é um estado escravagista, autoritário, patrimonialista, que existe há vários séculos. Com isto não estou tirando o peso do neoliberalismo como produtor de miséria. Mas o problema do Brasil não é o neoliberalismo, é o Estado. O neoliberalismo integra pelo mercado. Dá telefone celular pra todo mundo e depois todo mundo se vira para trabalhar e pagar a conta no final do mês. É perverso isto. Mas a Telerj não conseguiu dá telefone pra todo mundo.

Reduzir juros não é solução, diz Cocco

Giuseppe estava afiado. Cotagiou a platéia também a sair do clichê midiático que a solução brasileira é a redução de juros e a mão salvadora do Palocci.

A solução no Brasil passa pela radicalização da democracia. 1 milhão de dólares para despoluir a baía de Guanabara pode ser nada se não houver democracia. Pode ser uma cifra inflacionada. Vai passar o tempo e baía vai continuar poluída. Os juros é um problema do Brasil, mas a redução deles não necessariamente resolve os nossos problemas. Isto porque a maioria das pessoas não tem sequer conta bancária. E pior do que os juros são os preços. Para o pobre, é melhor ter juro alto para ter preço baixo. Do que ter inflação. Henrique Cardoso ganhou duas vezes a eleição pois optou por isto. Não há como a gente esperar mais uma política econômica salvadora. A política econômica não vai possibilitar a universalização do emprego salarial. Esse é um horizonte impossível, mas que as esquerdas ainda acreditam, de forma abstrata. A política econômica está presa à irreversibilidade da globalização, à interdependência dos mercados. Temos que optar e perceber que é a política social – e não só a econômica – que pode modificar a estrutura econômica brasileira. Veja o caso da bolsa-família. É uma política para os pobres. É uma política revolucionária. Apesar de alguns setores do governo e da sociedade pensar que ela seja só uma política compensatória. O pleno emprego não é mais horizonte. Ter renda, hoje, é poder construir a condição a priori para ser produtivo. Antes, no pleno emprego, ser produtivo é uma condição a posteriori. Só tendo salário pode se ser produtivo. A bolsa família, ao possibilitar a renda, impulsiona o cidadão para uma produtividade. As cotas também são revolucionárias, pois insere na produção de saber aqueles que sempre foram marginalizados pelo Estado autoritário e racista . O saber é o centro do capitalismo atual. Então são as políticas socias que possibilitam a integração econômica. Não há como esperar uma nova política econômia para ser política social.

Uma mesagem para militância

Negri fechou a sua participação convocando todos para uma conversão ideológica. Uma ruptura geracional. Muitos já formulavam a sua opinião sobre a palestra, principalmente, os sindicalistas ficaram chocados com alguém que acabaram com os seus clichês e não perceberam que a filosofia de Negri trazia para eles uma possibilidade de liberação. De aumento de liberdade. Mas como sou da comunicação, sei que o efeito do discurso é de longo rpazo, mesmo que tenha respostas de curto prazo. Não sei o que vai ficar para as pessoas de Nova Iguaçu que estiveram lá, mas pelo menos vão ter um dilema ideológico para ser resolvidos nos grupos de miltância. Negri aponta a sua última fala como uma chamda para a construção de um outro mundo: imanente e não transcedente. Real e não abstrato.

A miltância hoje não é distribuir panfleto, colar cartaz, dizer palavras de ordem. Militar é investigar. Fazer pesquisa para entender esses desdobramentos do trabalho. Identificar a capacidade produtiva do trabalho para fazer militância. É um trabalho cultural. Queria dizer algumas outras coisas: a divisão do primeiro e do segundo mundo é cada vez mais volátil. E nas sociedades onde o peso colonial ainda é forte (onde o problema de raça persiste) as políticas de cotas libertam as amarras coloniais. Hoje o que é a precarização no primeiro mundo se aproxima muito do que seja a exclusão no terceiro. Como responder então a precarização e a exclusão? É a mesma resposta que daria para como responder a crise política no governo Lula: qual é o nosso nível de acúmulo de indignação e de insuportabilidade? Isto é importante, agora, não para organizar caminhos de fuga oportunista, mas para acumular ruptura de base. A globalização não tirou a possibilidade de transformar o mundo, mas diluiu sobre toda a face da terra essa possibilidade. Há várias cargas políticas hoje no mundo pronta para explodir. Temos de reconhecê-las para guiá-las. Hoje portanto o grande problema é se inserir no mercado mundial buscando localizar essas questões. Não se trata de auto-flagelamento, mas estar sempre pronto para uma tentativa de renovação.

Fim de papo, mas não de afecções… amanhã continua no Capanema.