A governança é norte-americana?

Sabemos que está na Califórnia (sob a tutela d´O Exterminador do Futuro) a instituição que governa a Internet. Trata-se da Icann (Corporação da Internet para Nomes e Números Designados, em inglês), órgão sob responsabilidade do Departamento de Comércio norte-americano.Este ano a Europa, na verdade os Estados Europeus, gritaram querendo participar tb do controle da web. Querem criar propostas de controle da web. Veja bem… apesar de estar nos EUA, a Icann é composta por diferentes setores sociais. Não é um instrumento de Estado.

Vejo com muita desconfiança a proposta dos Estados governarem a Web. Não acredito no Estado, em si. É só ver como o Estado Chinês faz coma Web: um instrumento de controle.

Ainda bem que na cúpula da Sociedade da Informação, a Icann fica onde está…

Questão global

Li em um blog algo que me deixou cabreiro: divulgar conflitos entre imigrantes e governo de outros países (como os que aconteceramna Bélgica e na Alemanha) seria uma estratégia francesa para mostra que o problema não é a sua política social, mas a presença dos imigrantes na Europa?

Os caros querem varrer para os outros países aquilo que os é próprio: a política social francesa está naufragando.

“O motim francês não é o novo maio de 68”

Em seu blog, Mehmet Koksal (jornalista belga de origem muçulmana que foi a Paris cobrir o motim para o seu blog) reproduziu um relato tenso entre jornalistas franceses e estrangeiros.

Após entrar nas periferias e conversar com os jovens – entrada facilitada pela sua origem imigrante – o blogueiro foi jantar no bairro chique francês com correspondentes estrangeiros. A conversa entre eles foi uma amostra do porquê a cobertura internacional está tão anti-imigrante e anti-islã. Sintetizando o que Koksal escreveu:

1. A imprensa optou por uma condenação do imigrante e do Islã como culpados. Isto porque a maioria dos jornalistas concorda que o islamismo prega a violência como prática social, logo, se a maioria dos amotinados são de origem islâmica, são violentos. Koksal responde o seguinte aos jornalistas: “Não é o Islã que tem um problema com a França, mas a França que tem um problema com o Islã. A República recusa tratar equitativamente os diferentes credos e provoca frequentemente os muçulmanos adoptando medidas de excepção”.

2. O motim francês não é um novo maio de 68. É a mania da França em teorizar tudo e esquecer do problema real. Em 68, os jovens eram filhos da classe média, filhos da Era de Ouro do capitalismo. Hoje, os jovens são franceses filhos da política de imigração frances pós-Guerra. “Eles são filhos do Pokemon e do Playstation”. Não adianta querer encontrar uma formulação teórica, política e social desse movimentos. Os jovens não formularam um discurso do que querem.

3. Um grupo de jornalistas perguntou ao Koksal: é possível ocorrer motins nas periferias belgas? Ele respondeu que a periferia na Bélgica é ocupada por burgueses franceses e holandeses. “Imagina a pauta de reivindicação: queremos fazer uma piscina no jardim ou uma troisième 4×4…”. A sala gargalhou.

4. Os jornalistas praticam a islãfobia. Muitos concordam cinicamente. Um jornalista italiano fala que o islã é um dos maiores desafios para os países europeus. Outros discordam. Pensam que não é o jornalismo que pratica a islãfobia, mas os governantes. Cita o caso de Villepin que, ao estourar os motins, convocou o líder religioso do Islã na França para pedir calma aos “rebelados”. O jornalismo, portanto, só descreve o fato. E o fato é: o governo francês que pratica a islãfobia. “Nós só relatamos”. Que cinismo!

5. Conclusão do jornalista belga na sua visita a PAris: os excluídos franceses vivem ao lado da França, “desde que a França os deixe de lado”.

6. Conclusão II: os franceses não sabem falar da sua exclusão, porque só gostam de falar bem de si, do tipo: Vive la Republique”

Sem tempo para a mídia

Mehmet Koksal, em seu blog, sobre o que se passa nas periferias, conta que, em conversa com os jovens que participam do motim francês, eles relataram que um jornalista francês fez a seguinte pergunta inteligente a eles: por que queimam carros à noite e não pela manhã? Os meninos: porque de manhã estamos dormindo.

Bela piada. Korksal conta essa anedota (real) para falar que o tempo do motim não é o tempo das redações midiáticas francesas, o que vem dando em uma cobertura racista e incompleta. De certo, há um problema sobre imigração pra ser resolvida, como quer a mídia. Mas este é um problema francês e não dos países dos imigrados, como quer também a mídia e o governo. Novamente: os jovens da periferia são franceses.

Vai mais um relato blogueiro de dentro:

Faz relativamente frio esta noite e os jovens passam o seu tempo a contar as histórias engraçadas sobre os jornalistas que estão nos subúrbios. Lá (na periferia) tem um que me interrogava porque automóveis queimados durante a noite? Disse-lhe que dormia até o meio-dia. O que que há? Queres que a gente acorde de manhã? (risos). Sei que os fatos que a imprensa, mas nosso horário não corresponde com o dos meios de comunicação

Em Paris nada mudou

Em matéria sobre os subúrbios franceses, Korksal mostra que na cidade de Paris nada mudou. Tudo está calmo. A única mudança é os helicopteros que sobrevoam a cidade em direção ao subúrbio. É claro (ou obscuro) a dupla visão da França, de Paris. Korksal relata que assaltos em estações de trem do subúrbio são comuns. Até os ladrões já são conhecidos. Só que não há política de segurança para esses locais. "Laissez-faire, laissez passer", digo eu.

O jornalista ainda declara, em seu blog, que, ao sair de Paris e voltar à noite para Saint-Dennis, tudo também está calmo, contudo, é seguido por um helicóptero, ao chegar na periferia.

Brincadeira!!!!

Testemunho em blogs

Pelo que se vê a população vive uma situação de não poder dormir com os barulhos dos confrontos franceses. É uma situação em que não se sabe difrenciar o que é sonho, consciência ou imaginação. Segundo um relato de dentro do conflito (desculpas pela tradução):

Aqui, não se vê os dias passarem, as noites não se contam mais. Há barulhos de automóveis, de pessoas que urram, gritam, que se insultam. Às vezes ouve-se gargalhadas ou barulhos de crianças. Ouve-se as sirenes dos automóveis de polícias ou os bombeiros, barulho das freiadas dos carros ou das prisões que ocorrem. Quando a noite definitivamente tem-se instalado e a calma das 2 horas da manhã por último tem-se imposto, as janelas abertas e as cortinas tiradas, os néons da viatura adentram na parte inferior da rua , começa o seu jogo de luz, como uma mão tensa que impedir-nos -ia deixar-nos ir num sono definitivo. Como uma porta entre o real e o sonho, a consciência e a imaginação, a vida e a morte. Boas-vindas ao meu mundo.

Liberdade, igualdade e fraternidade

Para quem quer ouvir as vozes que vêm do subúrbio francês, contado pelo nacionalismo, é só dá um pulo em um blog chamado Liberté – Egalité – Fraternité

Jacques Lagan é o nome do blogueiro, que defende os valores franceses contra a ralém dos outros franceses (os do subúrbio). Declara que o motim é feito por jovens ligados ao tráfico, que não quer a Polícia entrandos nos territórios marginais que são controlados pelo tráfico.

Tenha dó.

Colocar fogo na impunidade

A situação francesa é um acontecimento político, antes, de midiático.

Ela mostra, primeiramente, que no cenário global, não há mais fora. O primeiro mundo está no terceiro, e o terceiro no primeiro. A França vive uma situação de ter um subúrbio aos moldes de países periféricos: um amontoado de excluídos. E os jovens são aqueles mais excluídos, pois muitos não conseguem acesso ao mercado de trabalho, ou por conta do racismo, ou por conta da diminuição dos gastos sociais que poderiam diminuir suas situações de exclusão.

Um segundo aspecto desse acontencimento: os jovens suburbanos são franceses. Com origem imigrante, mas são franceses. São netos ou filhos de uma geração de imigrante. O que estamos lendo na mídia tradicional é que são os bárbaros que estão contaminando a civilização. Contudo, os bárbaros estão excluídos do relato jornalístico. Primeiro, porque a imprensa francesa os criminaliza, por um outro lado, porque os jovens não se deixam representar mais pela imprensa. Não falam com a imprensa. Falam por conta própria nas centenas de blogs que criaram.

Um relato que não veio dos blogs, mas da mídia séria francesa, é dos jogadores da seleção de futebol. A maioria deles pertence a mesma realidade dos jovens que resistem à política imperial francesa. Eles declararam que a política racista é a forma tradicional de os governos lidarem com essa população:

"Lilian Thuram, campeão da Copa-1998 e da Eurocopa-2000, ""tomou as dores" dos suburbanos após declarações do ministro do Interior francês, Nicolas Sarkozy.""Eu também cresci em subúrbio e senti de perto o que esses jovens sentem. Quando alguém diz que é preciso limpar [as cidades] com Karcher [marca de jato de água]… Talvez Sarkozy não saiba o que está dizendo. Eu tomo isso como algo pessoal".Thuram, 33, é visto como a primeira personalidade a retrucar à altura Sarkozy. ""Também me disseram "você é escória". Mas eu não sou gentalha. O que eu queria era trabalhar. Talvez, ele [Sarkozy] não tenha captado essa sutileza."


Florent Malouda, meio-campista do Lyon, diz que a situação de revolta popular era inevitável. "Pessoas nos subúrbios estão desesperadas. Caminhava para isso", falou ele, que veio da Guiana.Eric Abidal, seu companheiro de time que cresceu em La Duchere, subúrbio de Lyon, concorda.""Chegamos ao limite. A situação é tudo menos nova, e a solução ainda está para ser achada. Quando estava lá [La Duchere], havia um supermercado, mas eles se recusavam a contratar pessoas da vizinhança. Entendo que as pessoas se cansem de tais coisas." (UOl, Especial Violência na França)

Um relato, de dentro do conflito, feito pela blogueira Armoni, mostra que o alvo dos jovens não é só carros, mas a estrutura social montada. É uma recusa também às medidas paliativas de contenção social da miséria. Ele relata — em alguns posts interessantes (com uma visão meio classe média) — que os jovens queimaram uma casa onde ela trabalhou. Era uma espécie de centro cultural onde era realizado trabalhos comunitários no âmbito da cultura (rap, danças, ateliês e etc). Além disso, estão queimando os prédios do 'Secour Populaire", instituição que distribui sopões, alimentos etcetera. Uma recusa a filantropia. Ela relata ainda que vivencia "meninos de ruas" que acabam largados à noite nas ruas, pois seus pais têm de trabalhar toda a noite, porque não encontram outros tipos de emprego, sem contar as suas habitações, completamente degradadas.

Blog e o novo maio de 68

Problema sério: foi retirado do ar o blog homenagem às vítimas da polícia francesa. A acusação é que o veículo tenha estimulado as manifestações em que estamos assistindo. A questão era que o blog fornecia informações sobre o "novo maio de 68 francês".

Amanhã, vou tentar fazer um especial sobre a cobertura conteudista do novembro 05 francês.